Com nome bonito para inglês ver, o Paraná se entrega ao modismo importado, mas segue à deriva, ao bel prazer dos comandantes de plantão.
Por Requião Filho
Sem sombra de dúvidas, a palavra mais famosa na seara jurídica e empresarial dos últimos dois anos é ‘compliance’. Oriunda do verbo inglês “to comply”, o vernáculo traduz o agir de acordo com uma ordem ou com um conjunto de regras.
No cenário corporativo, encontra-se ligado à conformidade ou à integridade, trazendo a ideia de alinhamento às regras da empresa, as quais necessitam ser estritamente observadas e cumpridas. Porém, o termo “compliance” é muito pequeno perto da responsabilidade que se espera do poder público, por isso não se aplica ao cenário das instituições públicas, uma vez que seus trabalhos já são, por natureza, amplamente fiscalizados e regidos pela Legislação.
Amante da publicidade e das propagandas que levam aos paranaenses um falso sentimento de tranquilidade e boa gestão, o Estado do Paraná não poderia deixar de pegar carona nessa modinha e incorporou ao seu governo um programa de “compliance”. Uma falsa sensação de segurança, para que a população acredite que tudo está sendo feito às claras e dentro da Lei… uma grande cortina de fumaça, claro!
E se você não sabia disso, então fique esperto! A administração pública é diferente da administração privada. Sim, o Governo não é uma empresa preocupada com o lucro e o crescimento da conta bancária de seus donos, mas sim algo que existe para administrar os recursos dos impostos que pagamos e reinvesti-los em estradas, hospitais, educação, segurança etc. O Governo deve prover condições básicas suficientes para que sua população possa investir em seus negócios com uma boa rede de energia elétrica ou de saneamento básico, pagando pouco, por exemplo.
Outra forma fácil de você entender o porquê de termos corporativos não se adequarem ao serviço público é prestando atenção no regime jurídico rigoroso ao qual é submetido a administração pública. Um gestor, como um prefeito ou um governador, por exemplo, pode somente fazer o que a lei prevê e ainda tem o Tribunal de Contas e a Assembleia Legislativa para fiscalizar tudo. É inútil se criar um termo novo para algo que, na prática, já existe de fato, mas em outras proporções.
A administração pública já se encontra submetida a uma imensidão de regramentos aos quais os servidores são obrigados a cumprir com a máxima rigorosidade, sob pena se severas represálias políticas, administrativas, pessoais e judiciais. Qualquer modelo de padrão comportamental que o “compliance” venha a oferecer, com a máxima certeza, apenas será um arremedo daquilo ao que os entes e funcionários públicos, por lei, já se encontram submetidos há longa data.
A Lei Estadual que institui o Programa de Integridade e Compliance no Paraná – Lei n. 19.857/19 deflagra justamente tal situação. A tratativa no âmbito estadual é tão rasa quanto o entendimento de um rato sobre Administração Pública. Trata-se de uma única lei, extremamente sucinta e que tão somente fornece diretrizes abrangentes e gerais sobre o que é o compliance, não trazendo qualquer novidade legislativa ao Estado ou ao servidor público.
À algumas das Secretarias é repassado um Plano de Integridade, sem formato de lei, lindamente editado, porém de conteúdo parco, absolutamente incapaz de atingir o objetivo de um real programa para promover a mudança comportamental dos funcionários, no caso, servidores públicos.
Não existe uma listagem em formato legal, adequada a cada atividade desenvolvida, daquilo que os funcionários devem fazer ou de como devem agir, de modo que o programa de compliance no Paraná é apenas “para inglês ver” – uma verdadeira farsa!
É tanta "transparência" que chega a parecer um vidro de um experimento num laboratório. Com atenção, veremos os camundongos correndo de um lado e para o outro, procurando uma saída ou um pedaço de queijo... talvez a solução seja o Governo parar de fazer graça e comece a focar na gestão pública e num bom exemplar da Constituição.
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Artigo publicado originalmente em Blog do Esmael.
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